Conversas telepáticas sobre assuntos preferidos: Efe Godoy
EFE GODOY - Conversas telepáticas sobre assuntos preferidos
junho/2023
As anamorfoses de Efe Godoy – Pablo Pires
A exposição Conversas telepáticas sobre assuntos preferidos apresenta uma inflexão na trajetória de Efe Godoy. Embora desenho, aquarela e pintura tenham sido sempre presentes em seus trabalhos, pela primeira vez a pintura se torna o eixo central. Seus temas são recorrentes: símbolos da natureza, a sexualidade e, sobretudo, a memória e o hibridismo nas formas.
As imagens criadas ou ressignificadas pela artista revelam seres híbridos, fundindo plantas, animais e seres humanos em formas singulares, com referências ao surrealismo, à arte psicodélica, mas que também remetem a um primitivismo da arte de povos originários e da arte popular.
As representações dessas múltiplas anamorfoses, híbridas e carregada de sexualidade, destacam-se pelo uso de imagens de orquídeas e mariposas, símbolo de transformação e metamorfose utilizado pela comunidade trans para expressar a possibilidade de convivência de diferentes sexos em um mesmo ser – afirmação do ginandromorfismo.
As flores, sobretudo as orquídeas, são imagens nas quais a artista expressa a ambiguidade sexual, sendo representadas ora por linhas ou por pinturas detalhadas das formas fálicas e ovulares naturalmente contidas na forma dessa flor. A expressão dialoga de maneira íntima com o inconsciente da artista, um lugar “entre mundos”. Suas escolhas quebram barreiras de sexualidade e afirmam a diversidade existente na natureza. Ou melhor, múltiplas naturezas em coexistência.
Nesse novo momento, Efe Godoy apresenta uma série de pinturas de dimensões bastante variadas, fotografias nas quais interfere com tinta e uma instalação composta de três esculturas. A materialidade da tinta sobre a tela ou sobre as imagens fotográficas se faz notar pelos traços simples ou pela sobreposição em pinturas mais complexas.
Nesta transição de seu trabalho, Efe se permite desabrochar e experimentar técnicas diversas. A sobreposição, no caso das três obras de grande dimensão, resulta de experiências vividas em residências.
Duas foram significativas e determinantes: a primeira em Puerto Iguazú (Argentina), na Tríplice Fronteira, onde o símbolo da cidade é uma mariposa. A segunda, na Serra Sagrada, em Santana do Riacho (Serra do Cipó, MG), possibilitou experiências psicodélicas com ayahuasca, o que permitiu à artista um deslocamento analítico e estético de seu próprio trabalho.
Os títulos dos trabalhos expressam a ambiguidade do desejo e da afetividade, além de explicitar sua forte relação com a música ao citar versos de autores contemporâneos.
Outro aspecto fundamental da obra de Efe é a memória, sempre relacionada à afetividade. A descoberta/achado de um álbum de fotografias antigo, retratando um grupo de mulheres em um cruzeiro, permitiu a criação e o fabular de relações com o universo próprio e os temas íntimos (e caros) à artista.
A partir de imagens antigas e “desconhecidas”, Efe reelabora a memória com intervenções e as incorpora a seu universo anamórfico. Um processo de antropofagia carregado de pessoalidade, bastante singular, mas que evoca uma memória atemporal, talvez xamânica, de tempos cíclicos e outros.
A obra de Efe não cabe em caixinhas, é uma constante metamorfose, questionamento e descoberta, de si própria e da sua arte.
Efe Godoy nasceu em Sete Lagoas, mudou-se para Belo Horizonte para estudar e se dedicar à arte. Estudou na Escola Guignard (UEMG), trabalhou com música e artes, além de participar de salões e residências.