Centrifugação por Beate Reifenscheid

José Bechara
Dezembro 15, 2018
José Bechara é um dos artistas mais interessantes da cena de arte contemporânea brasileira. Iniciou a carreira como pintor, com uma forma de linguagem radicalmente reduzida, compromissada, ainda hoje, com a arte concreta no sentido mais amplo da palavra. São a sua noção e o seu entendimento profundos das estruturas construtivas que formam o esqueleto interno de suas pinturas, que modulam cores num tipo de espaço flutuante, ilimitado. A partir de figuras quadradas com arranjos e grades de linhas rígidas, suas pinturas oscilam entre a concretude de formas e estruturas e a inconcretude do espaço. Juntos, esses elementos se assemelham ao movimento de um pêndulo, entre pinceladas abstratas livres, tinta colorida e formas geométricas, as quais, por sua vez, parecem diferentes camadas dentro desse espaço. Contudo, fica claro também que o foco do artista está sempre em penetrar o espaço e compreender suas dimensões em percepção. O concreto e o não concreto estão fundamentados diretamente no nível das perspectivas possíveis.
Algumas das formas geométricas estão expostas nas esculturas de Bechara, em suas repetidas formas quadradas, que também jogam com o conceito de estruturas em série. Com sua abertura e mobilidade aleatórias, elas oferecem todas as possibilidades de serem ajustadas aos espaços escolhidos. Esse ajustar a qualquer tipo de espaço é uma ideia conceitual dirigida diretamente ao espectador ou colecionador, que são convocados a “usar” a escultura para seus próprios fins. Tudo que for mudado pelo espectador faz parte do conceito, que apenas gira em torno dessa ideia de espaço, que consiste em diversas grades estruturais – visíveis e invisíveis.
As novas obras em vidro de Bechara são, portanto, uma continuação lógica de seu trabalho anterior e até mais conceituais. Fundamentadas na materialidade sólida do vidro, são tanto um elemento factual e, desse modo, uma barreira no espectro contínuo do espaço, como um fato aparentemente invisível, que não cria qualquer barreira entre o espectador e o espaço. São, assim, uma contradição em si, questionada apenas pelos vários itens que Bechara combina com as placas de vidro, como uma grade vermelha, uma cabeça prateada (autorretrato do artista) ou pequenos pacotes embrulhados e coloridos. Por vezes, diversas camadas de placas de vidro formam, ao mesmo tempo, uma estrutura geométrica e um objeto, o que não só torna a transparência visível, mas também reflete a solidez das formas quadradas. Na arte contemporânea, o vidro é um material recém-explorado e artistas famosos, como Pierre Soulages, Gerhard Richter e Ai Weiwei, fizeram experiências com ele. As obras em vidro de José Bechara salientam a percepção conceitual do construtivismo brasileiro e a transferem para uma abordagem contemporânea.
 
Profa. Dra. Beate Reifenscheid
Diretora do Museu Ludwig de Koblenz, Alemanha.
Texto escrito para exposição Fluxo Bruto, de José Bechara, Rio de Janeiro, Brasil, 2017.