Escultura. Pintura. Escultura. Fotografia. Pintura. Desenho. Tela. Papel. Aço. Barro. Madeira. Pintura. Campo de experiências.
Evite acidentes. Em vez da pressa, o tempo dilatado da fruição. Em vez do gesto descuidado, o cálculo intuitivo. Em vez do contato desatento – vazio de sentido – o toque que descobre a si mesmo e a sua capacidade de responder ao convite que lhe fazem a forma, a matéria e suas qualidades.
Evite acidentes. Um manifesto contra a brutalidade? Uma recusa do desastre em favor da ética. Evite acidentes. Um manifesto contra os perigos da irresponsabilidade? Abaixo a grosseria! Contra a destruição! Pelo diálogo! Contra a negligência! Contra o descaso! Evite acidentes. Pela aliança entre o imprevisto e a matemática. Evite acidentes. Um manifesto em favor da gentileza?
Os balanços são impecáveis – projetados e realizados com esmero e com o apuro da peça única – pousam sobre o objeto industrial, reproduzido em larga escala, puramente utilitário: a garrafa. São também o contemporâneo pousado sobre a atemporalidade do barro. O aço volta à idade do ferro. Os tempos se embaralham. Olhe! Veja! Toque. Atenção! Cuidado! Olhe outra vez. Entenda.
O ateliê veio para a galeria com sua nudez de mesa de trabalho e de projeto, com sua inteireza de projeto e jogo. Evite acidentes. O prazer vence o tédio. O prazer triunfa sobre o desgosto.
Escultura. Pintura. Fotografia. Quantidade: tudo + papel. Qualidade: tudo mais papel. Atenção. Dedicação. Experimentação sobre o sensível. Mais papel + mais zelo. Mais papel = pouco. Mais papel = poema.
Jogo de presenças. Jogo de escalas: o aço em grande dimensão e a folha de papel entintada a preto. Jogo de memórias: o mundo gráfico, a gravura e o vagão de metrô flagrado pela tela do celular. Jogo de geografias: uma fotografia da praia e uma pedra de ferro, Rio de janeiro e Minas.
Jogo de matérias/naturezas: o mineral e o vegetal. Quem é mais transigente? Quem é mais severo? O aço balança, brinca, responde, o que era inflexível convida para a dança. Mas é preciso cuidado – porque é leve, porque é frágil; porque é grande, porque é pesado. Evite acidentes! O papel parece – à primeira vista – complacente, fácil, acessível; mas no trabalho é, ao contrário, matéria exigente, complexa, que requer o rigor e recusa o que o procura levianamente. Sua memória é milenar, sua presença repercute a atemporalidade das florestas. É intransigente com a mentira. É delicadamente in-tran-si-gen-te. É preciso muito, muito cuidado. É preciso verdade.
Tudo mais papel! Abaixo a ignorância que derruba o que se conquistou com trabalho e esperança! Mais habilidade! Mais sonho! Mais conhecimento! Mais entendimento! Abaixo a rispidez! Fora a brutalidade que goza com o obscurantismo! Um pouco mais de fineza, por favor. Evite acidentes! Abaixo a crueldade!
Experimente: faça o gesto certo. Ouça o que dizem o peso, as texturas, as configurações do corpo. Aceite a dúvida, não se assuste com o tamanho do que parece grande; não despreze as demandas do que parece pequeno. Viva a suavidade! Abaixo a exorbitância de força, de poder, de trevas! Por mais amabilidade! Viva os apóstolos da gentileza! Abaixo os profetas da estupidez e da deselegância!
Comecemos assim: evite acidentes.
Eucanaã Ferraz
Curador