Exposição Institucional: Museu de Arte da Pampulha

Isaura Pena

Isaura Pena desenha com a água. Longas aguadas são aplicadas sobre o papel num exercício persistente e contínuo de sobreposição de linhas e gestos. As superfícies alvas são maculadas pelo negro da tinta e da água, que se acomoda aos seus espaços e entranha pelas texturas do papel. O grão do papel que recebe o líquido necessita de tempo para fusão. A carga de cor ou de tom constitui-se a partir da adição de pigmento, a tinta líquida – nanquim – derrama-se pelo papel pouco a pouco, adquirindo corporeidade e peso. Mas é preciso esperar pelo gesto seguinte – aplicar, secar, aplicar. Os longos espaços entre uma operação e outra marcam o tempo de cada trabalho. Aqui tempo e espaço se fundem. Assim como as forças da natureza constroem a paisagem, Isaura Pena desenha. Ao nos depararmos com elementos da natureza poucas vezes nos lembramos de seu processo de construção. Montanhas e serras formam-se a partir de sedimentos que se acumulam ao longo de anos, séculos e milênios. A adição de pequenas fontes de água que brotam das nascentes rasgam a terra, expandem, ocupam espaços, formam os rios. O tempo é condição para que os eventos da natureza ou para o advento plástico no desenho de Isaura possam existir.
Adição, acúmulo, repetição – um mesmo gesto gravado no papel originando um maciço de 11.500 folhas de papel empilhado. O desenho/objeto/gravura realizado em offset não possui a fluidez aquosa dos desenhos de superposição de manchas. As folhas de papel colocadas uma sobre as outras, acima da nossa linha do horizonte, não nos permitem ver o desenho, no entanto, as folhas empilhadas formam um sólido com a presença de uma linha no seu dorso. Uma reta é uma seqüência de pontos? A linha reta, gerada pela sobreposição de um mesmo desenho, contrapõe-se ao gesto que a originou, orgânico e matéria líquida. O que é planográfico torna-se volumétrico.
As formas monocromáticas que Isaura utiliza em seus desenhos são rítmicas quando repetidas, atribuindo valor aos espaços em branco do papel. Seriação e autonomia estão presentes neste trabalho, constituído de 150 fragmentos de uma mesma forma construída pela linha negra que gira no espaço. O que era repetição adensa-se, ganha corpo.
Poucas vezes natureza e construção estiveram tão próximas. O resto é silêncio.


Marconi Drummond (Curador), Fabíola Moulin (Coordenadora de Artes Visuais)

Julho 4, 2007